Cristologia a partir do Nazareno

Humano assim como Jesus, só Deus mesmo.” as famosas palavras são do teólogo brasileiro Leonardo Boff que neste breve texto nos conduz pela experiência de encontrar em Jesus de Nazaré o verdadeiro Homem e o verdadeiro Deus. A Humanidade e a Divindade de Jesus são postas a descoberto na sua própria vida. Não por mandato de alguma autoridade externa. Mas por total abertura e dádiva interior.


«Da sua vida aprendemos e da sua boca ouvimos que a existência tem que ser pró-existência, em prol dos outros e do Grande Outro (Deus). Pois Jesus viveu este modo de ser tão radicalmente, que nele se revelou o novíssimus Adam (cf. 1Cor 14,45). Era absolutamente aberto a todos, não discriminava ninguém, a ponto de dizer que, “se alguém vem a mim, não o mandarei embora” (Jo 6,37). Se era liberal face à lei, era exigente com referência ao amor incondicional.

Particularmente com o Grande Outro, Deus, cultivou uma relação de extrema intimidade, chamando-o de Abba, Papá querido (cf. Mc 14,36; Rm 8,15: Gl 4,6). Consequentemente ele mesmo se sentia seu Filho (cf. Mt 11,27 par: Mc 12,6 par. 13,52 par). Essa relação não traz nenhum resquício de um eventual complexo de Édipo mal realizado: ela é diáfana e transparente. Suplica, sim, ao Pai que o liberte da dor e da morte (cf. Mc 14,36 par: Jo 11,41-42), mas, mesmo aí, quer realizar não a sua vontade, mas sim a vontade do Pai (cf, Mc 14,36). A sua última palavra é de entrega serena: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 22,46). Ele entende-se totalmente a partir do Pai a ponto de dizer: “Eu e o Pai somos uma coisa só” (Jo 10,30). Pelo facto de se ter aberto e entregado totalmente ao Pai, não possuía aquilo que o Concílio de Calcedónia ensinou: faltava-lhe a “hipóstase”, a “pessoa”, a subsistência, o permanecer em si e para si mesmo. Ele era completamente vazio de si mesmo para poder estar repleto do Outro. Ele realizou-se totalmente no Outro, não sendo nada para si, mas tudo para os outros e para Deus. A falta de “personalidade”, no sentido antigo, não constituía falta, mas era a marca de Jesus. Não era imperfeição, mas a máxima perfeição.

O fazer-se vazio significa criar espaço interior para ser plenificado pelo outro. É saindo de si que o ser humano se constrói mais profundamente para si e fica em si; é dando que recebe e possui o seu ser. Por esta razão Jesus é o ecce homo: porque a sua radical humanidade foi conquistada, não pela autárquica afirmação de si mesmo, mas sim pela entrega irrestrita do seu ser aos outros e ao Grande Outro: “Eu dou a minha vida pelas ovelhas” (Jo 10,15).

Quanto mais Jesus estava em Deus, mais Deus estava em Jesus. Quando mais o homem-Jesus estava em Deus, mais se divinizava. Quanto mais Deus estava em Jesus, mais se humanizava. Ora, o homem Jesus estava de tal forma em Deus que se identificou com ele (cf. Jo 10,30). Deus estava de tal forma no homem-Jesus, que se identificou com ele. Deus fez-se homem para que o homem se fizesse Deus.»

Leonardo Boff

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